domingo, setembro 21, 2008

... E por falar em índios e brasileiros...

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado e ecologista - lfmunizz@gmail.com e http://luizfelipemunizdesouza.zip.net/
Campos, 19/09/2008.

Mais uma vez nos encontramos na encruzilhada das eleições municipais – talvez a mais importante de todas – e paira no ar aquela sensação amarga de continuísmo crônico da desordem. Exatamente aqui, nos campos dos bravos povos goitacá de outrora e no laboratório dos engenhos de açúcar da colônia, movidos à força bruta de negros e de índios em maldição eterna. Será esse o nosso carma coletivo? Talvez sim, talvez não! Mas esta é ou não é a história de toda uma nação?

Entender o furacão financeiro em escala global, a saga do povo de Evo Morales e o drama da Raposa Terra do Sol parece muito mais fácil do que assimilar os desígnios dos deuses reservados para Campos dos Goytacazes em pleno século XXI, tão rica e tão miseravelmente conduzida por “legítimas” lideranças políticas.

Relendo o “Povo Brasileiro”, do grande intelectual que aprendeu a ser político: Darcy Ribeiro, encontro algumas pérolas para a nossa inoportuna reflexão sobre os tempos passados e de agora:

“...o Vaticano estabelece as normas básicas de ação colonizadora...É o que se lê na bula Romanus Pontifex, de 8 de janeiro de 1454, do papa Nicolau v:
...infante d. Henrique, incendiado no ardor da fé e zelo da salvação das almas, se esforça por fazer conhecer e venerar em todo o orbe o nome gloriosíssimo de Deus, reduzindo à sua fé não só os sarracenos, inimigos dela, como também quaisquer outros infiéis...Por isso nós, tudo pensando com devida ponderação, concedemos ao dito rei Afonso a plena e livre faculdade, entre outras, de invadir, conquistar, subjugar a quaisquer sarracenos e pagãos, inimigos de Cristo, suas terras e bens, a todos reduzir à servidão e tudo praticar em utilidade própria e de seus descendentes...
...o Novo Mundo era legitimamente possuível por Espanha e Portugal, e seus povos também escravizáveis por quem os subjugasse... ” pág. 39/40

Em toda a América do Sul se deu, e ainda se processa, o encontro de mundos díspares. Na costa brasileira a coisa foi, e ainda é, muito mais ardente e gloriosa com a chegada dos negros africanos encruados e maltrapilhos.

O intelectual e político Darcy Ribeiro afirma em sua obra que “Frente à invasão européia, os índios defenderam até o limite possível seu modo de ser e de viver. Sobretudo depois de perderem as ilusões dos primeiros contatos pacíficos, quando perceberam que a submissão ao invasor representava sua desumanização como bestas de carga.”pág. 49 Quanto aos negros ele relata que “Apresado aos quinze anos em sua terra, como se fosse uma caça apanhada numa armadilha, ele era arrastado pelo pombeiro – mercador africano de escravos – para a praia, onde seria resgatado em troca de tabaco, aguardente e bugigangas...Metido no navio, era deitado no meio de cem outros para ocupar, por meios e meio, o exíguo espaço do seu tamanho, mal comendo, mal cagando ali mesmo, no meio da fedentina mais hedionda. Escapando vivo à travessia, caía no outro mercado, no lado de cá...outro comboio, agora de correntes, o levava à terra adentro, ao senhor das minas ou dos açúcares, para viver o destino que lhe havia prescrito a civilização: trabalhar dezoito horas por dia, todos os dias do ano.” pág. 119

Os europeus que aqui aportaram, segundo Darcy, “eram gente prática, experimentada, sofrida, ciente de suas culpas oriundas do pecado de Adão, predispostos à virtude, com clara noção dos horrores do pecado e da perdição eterna...a vida era uma tarefa, uma sofrida obrigação, que a todos condenava ao trabalho e tudo subordinava ao lucro.”pág. 47

E agora nós brasileiros – mais do que mamelucos e crioulos –, o quê somos e para onde seguimos?

Segundo Darcy, o ex-senador da República, “somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado...Essa massa de nativos oriundos da mestiçagem viveu por séculos sem consciência de si, afundada na ninguendade...até se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros...Olhando-os, ouvindo-os, é fácil perceber que são, de fato, uma nova romanidade, uma romanidade tardia mas melhor, porque lavada em sangue índio e sangue negro.”pág. 453

Se os nossos Partidos Políticos regionais não puderem ser inundados por pensadores tão obstinados como o foi Darcy Ribeiro para o Brasil, penso que perdemos muito todos. O tempo da pesquisa e do discurso acadêmico precisa abrir espaço à dialógica desafiadora do encontro / desencontro, mais que real, com o povo que todos somos. A cidade de Campos dos Goytacazes precisa ser reinventada, como a Bolívia de Evo Morales, como o sistema financeiro global, etc, e certamente este trabalho deve ser simultâneo e perene junto aos Partidos Políticos, pois a Democracia não passa de uma idéia – as Instituições da República nos provam isso –, ela ainda é um pequeno embrião entre nós!

domingo, setembro 07, 2008

A Petrobras ainda deve muito a Campos...

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado e Ecologista -
lfmunizz@gmail.com - http://luizfelipemunizdesouza.zip.net/
Campos, 06/09/2008.

Como o tempo passa rápido e como as coisas nesta cidade não avançam como poderia!

Lembro-me bem de quando ingressei – por concurso público, diga-se de passagem – nos quadros técnicos da Petrobrás há mais de 25 anos atrás.Uma empresa pública como poucas no país, promissora e vanguardista, mas que naquela ocasião sofria muito com as intervenções político-partidárias. Ainda assim, ela se superou e hoje exuberante mostra para o mundo o quanto cresceu no cenário de energia e de organização.

Infelizmente, para nós campistas, a Petrobrás cresceu muito sim, mas não incluiu a cidade de Campos em nenhum de seus importantes projetos de gestão e de apoio logístico. Na verdade a cidade apenas viu o seu nome percorrer o mundo afora na denominação do maior campo de produção do Brasil – Bacia de Campos –, mas não passou disso...

Na década de 70, bem no início das atividades de prospecção e exploração, era pública a briga entre Macaé e Campos para sediar a base da Petrobrás, muitos de nós acompanhou e muitos campistas influentes se calaram diante dos poderosos da indústria canavieira local, permitindo assim, que todo o investimento logístico e técnico, da maior zona produtiva da Petrobrás, fosse para Macaé.

Muito bem, de lá pra cá já se vão mais de 30 anos, boa parte dos profissionais técnicos embarcados moram em Campos; diariamente saem de Campos mais de 20 ônibus fretados – aproximadamente 900 funcionários/dia – levando profissionais administrativos e técnicos que trabalham na sede da empresa em Macaé, correndo um risco no mínimo desnecessário por tanto tempo de exposição na BR-101. Sem considerar o caótico trânsito em Macaé pela manhã/tarde e a falta de espaços para expansão de prédios na base de Imbetiba!

Hoje a dívida com Campos se ampliou muito. A Petrobrás está num fantástico processo de expansão no Brasil, muito por conta das novas descobertas no pré-sal e muito por conta do pioneirismo no campo dos Biocombustíveis. A Cia inaugurou recentemente as suas 03 primeiras Usinas de Biodiesel – Quixadá/CE, Candeias/BA e Montes Claros/MG – com um nítido perfil de inclusão social dos pequenos e médios produtores rurais, que terão a partir de agora a garantia de preço e de compra de seus produtos agrícolas, uma conquista de fato histórica! Uma nova e moderna sede está sendo erguida em Vitória/ES...esta semana foi decidido que nova sede também será construída na cidade de Santos/SP.

Enquanto isso a sociedade campista e particularmente os nossos produtores rurais continuam sofrendo com a lavoura de cana-de-açúcar. A “parceria” com as usinas é um vexame, ganham somente os atravessadores e as usinas que restaram! Na lavoura continua sobrando cana que somente pagam R$ 8,00/Tonelada! A cada ano que passa produzimos menos por hectare por falta de apoio técnico e por falta de maior lealdade com aqueles que de fato produzem na terra. Não adianta apenas dizer que a indústria canavieira precisa de investimentos, antes precisa de ordem, de ética e de parceria leal, coisas raras entre nós campistas!

Eu creio que a presença de uma Usina de Biocombustível e um importante segmento da alta administração da Petrobrás em Campos dos Goytacazes seria a salvação sim de nossa rica história com a cana-de-açúcar, bem como, uma tentativa audaciosa de resgate concreto de nossa micro-região (norte-fluminense), através da implantação local de modelos de gestão profissional mais comprometidos com os aspectos éticos e sócio-ambientais da atualidade. Campos merece mais do que isto que aí está, cobremos à Petrobrás e às lideranças locais!