sexta-feira, abril 29, 2011

Representação ao MPE dos representantes da sociedade civil questionado a situação das catadoras de lixo com o fim do Lixão

O documento foi enviado ao blog pelo professor e assistente social, Renato Gonçalves, em 28 de abril de 2011:

"Campos dos Goytacazes, 30 de Março de 2011.

Exmos. Srs. Promotores de Justiça da 1a e da 2a Promotorias de Justiça e Tutela Coletiva/Núcleo Campos.

Drs. Êvanes Amaro Soares Júnior e Marcelo Lessa Bastos

Senhores Promotores

DOS FATOS

O Conselho Regional de Serviço Social /Delegacia de Campos, situado à rua 21 de Abril, 272 Sala 311, Centro; o Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense, situado à rua José do Patrocínio, 71, Centro; o Lar Fabiano de Cristo, situado à Av. Francisco Lamego, 321, Jardim Carioca, representantes da sociedade civil no Conselho Municipal de Assistência Social de Campos dos Goytacazes - gestão 2009/2011 -, neste ato representado(a) por Renato Gonçalves, Érica T. Vieira de Almeida e Luciana Custódio, o professor Aristides Arthur Soffiati Netto, RG 02285013-5 – IFP, residente à rua do Ipiranga, 56/602, Centro em Campos dos Goytacazes e Erica Justino de Alvarenga, residente à rua Principal nº53 na Terra Prometida, Sabrina da Silva Menezes, residente à rua 08, casa06, no Novo Eldorado, Admirta Guilherme da Silva, residente à rua A nº 50, no Parque Santa Edwirges, Bianca Ramos da Silva, residente à rua Santa Maria nº23, na Terra Prometida, Danielle dos Santos, residente à rua São Mateus nº 38 e Deise Nogueira dos Santos, residente à rua Principal nº 34, na Terra Prometida, representando os catadores de resíduos sólidos, infra-assinado(a)(s), vêm à presença de V. Exas. apresentar NOTÍCIA com base na Constituição Federal (Capítulo dos direitos sociais), na Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS e na Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº. 12.305 de 02 de agosto de 2010), requerendo, desde já, que o que o Ministério Público Estadual tome as providências necessárias para que o Poder Executivo Municipal, em respeito às LEIS SUPRACITADAS, torne público o contrato entre ele e a empresa responsável pela COLETA E DISPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS do município de Campos, assim como tome todas as providências necessárias à inclusão social e econômica dos trabalhadores que, há décadas, tiveram como a sua única e/ou principal renda a catação desses resíduos, hoje objeto de discussão pública com vistas à integração social e econômica dos mesmos.

Em maio de 2010, o CMAS recebeu um ofício de nº14/2010 (anexo 1) assinado pela assistente social Marza Batista e pela pedagoga Lourdes Castilho, ambas da Empresa Vital Engenharia Ambiental, documento este que também foi enviado aos vários órgãos e secretarias do município, relatando não só a situação daqueles que trabalham no “lixão”, mas, também, a sua maior preocupação – o fim da renda auferida com a catação e a venda do lixo reciclável com o fim do ATERRO CONTROLADO e a implantação de um aterro sanitário na localidade de CONSELHEIRO JOSINO, já licenciado pelo INSTITUTO ESTADUAL DO AMBIENTE (INEA).

Segundo o documento, em diagnóstico realizado em março de 2008, foram cadastrados 258 catadores, sendo 58% de mulheres. A renda da catação foi apresentada como a principal renda da família, mesmo para aqueles que são beneficiados por algum programa de transferência de renda (Bolsa Família ou Cheque-Cidadão). Dos trabalhadores entrevistados, 38% são catadores há mais de 10 anos, 21% têm entre 6 e 10 anos no lixão, 29% entre 1 e 5 anos e 11% até 1 ano.

A Terra Prometida concentra 39% dos catadores, seguido do Parque Eldorado (11%), Parque Santa Rosa (9%), Vila Industrial (7%) e Codin (6%). A maior preocupação dos catadores, como já adiantamos, é com a desativação do aterro controlado ou “lixão”, nas suas palavras, em decorrência da nova política de resíduos sólidos aprovada em agosto/2010. Segundo os mesmos, eles perderão a sua principal atividade de renda. De acordo com os técnicos da Empresa Vital Engenharia Ambiental responsável pela COLETA E DISPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DO MUNÍCÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES, apenas 90 trabalhadores serão aproveitados na nova Usina de Reciclagem, um número bastante inferior àquele apresentado pelo diagnóstico (258) e pelos relatos dos próprios trabalhadores (mais de 300 catadores). As demais dúvidas são quanto ao início das atividades, aos critérios para a contratação, à situação de exclusão daqueles que não serão aproveitados, geralmente, aqueles que estão na catação há mais de 20 anos.

Somam-se a essas preocupações algumas outras como: 1) quais os termos desse contrato; 2) se o contrato entre a PMCG leva em consideração as diretrizes contidas na nova política nacional de resíduos sólidos e 3) se o PODER EXECUTIVO MUNICIPAL, no seu plano, tem a intenção de promover as atividades de cooperativas e associações de catadores de resíduos recicláveis e entidades de reciclagem, por meio de linhas de financiamento.

Cabe ressaltar que o processo de reciclagem adotado pelo município não apenas não incorporou os catadores tradicionais como também impossibilitou, com a coleta seletiva, que os catadores do lixão tivessem a sua renda aumentada, haja vista que “o lixo que chega ao lixão não tem mais a qualidade de antes” (palavras de uma catadora).

Segundo o próprio secretário Zacarias Albuquerque de Oliveira, a coleta em órgãos públicos, Ongs e empresas potencializou a coleta seletiva em Campos: “No início do atual governo, eram coletadas, em média, 43 toneladas/mês. A partir da nova estratégia implementada, já chegamos a 66 toneladas/mês de materiais recicláveis (plástico, papel, latas, alumínio e vidros)”. Ainda de acordo com o chefe da coleta seletiva, o trabalho é executado em 102 pontos, por 20 garis em caminhões-carroceria da Concessionária Vital Ambiental. Ele afirma, também, que todo o material reciclado recolhido é distribuído para depósitos municipais que separam o lixo e vendem para as indústrias que reciclam. O dinheiro recebido desta comercialização é destinado à Sociedade de Apoio à Criança e ao Idoso (Saci), gerido pelo Rotary Clube de Campos. Nas palavras do chefe da coletiva seletiva,
“nós tiramos as despesas da unidade e, com o lucro líquido, transformamos em cestas de alimento que são distribuídas para entidades credenciadas”.

Causa-nos estranheza não só a exclusão dos catadores, pelo menos daqueles que sempre estiveram no lixão da Codin, desrespeitando o art.18, inciso II, da Política Nacional de resíduos sólidos:

“implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda”,

mas, também, a forma como o executivo municipal vem operando com os recursos auferidos com a comercialização do lixo reciclável, que, a nosso ver, deveria ser realizada com a participação dos catadores que sempre viveram da renda do lixo, quando ele ainda não tinha tanto valor monetário.

Além disso, enquanto representantes do CMAS, gostaríamos de destacar que, enquanto ONG de apoio à infância e ao idoso, ela não possui registro no CMAS. E mais, segundo a legislação, nenhuma ONG ou entidade tem a prerrogativa de distribuir recursos públicos, oriundos ou não do Orçamento, já que cabe aos conselhos tal função.

Diante do exposto, manifestamo-nos contra a exclusão dos catadores tradicionais no processo de coleta seletiva que vem sendo implementado no município e solicitamos que V. Exa. tome as medidas necessárias ao cumprimento da nova política nacional de resíduos sólidos, sobretudo no que se refere ao art.19 e 42, que tratam do plano municipal.

Art. 19 - O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos tem o seguinte conteúdo mínimo:

XI - programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver;

XII - mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a valorização dos resíduos sólidos;

Art. 42. O poder público poderá instituir medidas indutoras e linhas de financiamento para atender, prioritariamente, às iniciativas de:

III - implantação de infraestrutura física e aquisição de equipamentos para cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda.

DO PEDIDO

1- Que o Executivo Municipal torne público o contrato entre ele e a empresa Vital Engenharia Ambiental responsável pela coleta e disposição dos resíduos sólidos do município;

2- Que o Plano Municipal a ser elaborado pelo Executivo Municipal, em conformidade com a nova Política Nacional de Resíduos Sólidos, leve em consideração as ações relativas à inclusão social e econômica dos trabalhadores que, há décadas, tiveram como a sua única e/ou principal renda a catação desses resíduos;

3- Que, com a desativação do aterro controlado e a instalação da nova Usina de Reciclagem, DO ATERRO SANITÁRIO DE CONSELHEIRO JOSINO, que prevê a contratação, como assalariados, de apenas 90 trabalhadores, o Executivo Municipal promova ações de inclusão social e econômica, em conformidade com a nova legislação sobre os resíduos sólidos, como cooperativas e associações de catadores de resíduos recicláveis e entidades de reciclagem, por meio de linhas de financiamento;

4- Que, ao contrário do que vem ocorrendo no processo de coleta seletiva, os catadores tradicionais sejam incorporados no processo, como, por exemplo, na separação prévia dos recursos sólidos, antes da disposição final;

5- Que haja transparência e controle social no que se refere à ação pública de coleta seletiva municipal, haja vista que os recursos auferidos com a comercialização do material reciclável é recurso de natureza pública e merece controle social, seja pelo CMAS (Conselho de Assistência Social), considerando as ações de apoio à criança e ao idoso, seja por outro Conselho;

6- Que as organizações coletivas dos catadores possam participar do debate público na elaboração do Plano Municipal DE RESÍDUOS SÓLIDOS, assim como outros segmentos da sociedade civil.

Muito atenciosamente."